Há uma ideia muito antiga, tão antiga como o humano, que quer reunir o som com uma fonte, um som que traz no seu rastro uma figura ou imagem. Esta matriz é também a origem de uma enigmática sensação: o som no nosso ouvido abre os olhos a uma fonte, possível origem desse som. O som traz consigo uma figura muda que quer ser revista. Mesmo já perdida a fonte, o cérebro quer saber a sua origem. Esta situação ocorre quando não há media de produção que alteram a matriz sonora. Neste caso, o som, pensemos no processo electrónico, é apenas o vestígio que quer fazer a sua própria representação.
Agora pensemos que quer organicamente quer estruturalmente nada no som deve remeter para uma representação ou uma materialidade. Assim sendo, o som acarreta uma orfandade e como tal tem apenas como indicação poisar-nos no mundo. Ele não quer ser mais do que as fundações de uma habitação ou uma moradia que torne possível uma existência plena, o melhor sensível dessa existência, que se revela no som como ponte e passagem para uma sintonia eficaz com o mundo. E essa «apresentação» não provém de uma significação, é apenas um efeito que pode ser diverso em cada indivíduo.
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Quando em 2011 iniciámos o projecto «Lisbon Sound Map» tínhamos como primeiro objectivo fazer um levantamento do mapa sonoro de Lisboa, sobretudo das áreas que estavam a sofrer alterações, seja na sua população residente, seja na construção. Este mapa sonoro é hoje importante para se entender as alterações dos fluxos e paisagens sonoras da cidade nesta última década.
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O conjunto dos eventos realizados em diferentes lugares da cidade e na universidade, sob proposta dos membros do projecto, possibilitam essa reflexão, que aqui se apresenta em capítulos que desejam desenvolver as relações da audição e do som com o meio envolvente e com a produção sonora para os media e as artes. Aprofundar estas relações tornou-se hoje numa urgência que os investigadores editados neste livro aceitaram.
[Luís Cláudio Ribeiro]