Com a Reforma e a revolta iconoclasta, nos séculos XVI-XVII, no Norte da Europa forma-se uma nova concepção da imagem, não mais relacionada com uma função litúrgica, até então preponderante, mas com o seu modo de exibição espacial. Com particular inventividade, os pintores dedicam-se à exploração de novas possibilidades e limites, centradas no jogo da verdade e (ir)relevância da arte figurativa. Ao considerarem a natureza morta e o lugar do pintor, a espacialidade alegórica das Colecções e das Galerias de Amadores de Arte, mas também o limiar de janelas e portas, os limites das molduras e até o reverso do quadro – segundo uma operação que não é espontânea mas antes uma autêntica invenção -, a representação pictórica transforma-se na matéria da própria representação e o discurso metapictural cristaliza-se para instituir o quadro como meio por excelência da visualidade e da reflexão pictórica.
Neste ensaio, Victor I. Stoichita indaga assim os jogos de perspectiva, o confronto do quadro com aquilo que representa, a amplificação da representação através dos espelhos, a integração das margens e a montagem de imagens, mas também a autorrepresentação do pintor, a exibição do Gabinete do Colecionador, a representação do quadro dentro do quadro e, por fim, a inédita figura do seu reverso, deste modo assinalado a crise e a condição crítica da pintura moderna.
Compreendendo na sua análise artistas tão relevantes como Velázquez, Van Eyck, Caravaggio, Van der Weyden, Memling, Rubens, Michelangelo, Dürer, Poussin, Annibale Carracci, Picasso, Goya, Gijsbrechts, e os grandes teóricos da arte da pintura, este ensaio consagra o seu autor como um dos mais eminentes intérpretes da cultura pictórica ocidental.