Jean-Luc Nancy: «Ninguém pode duvidar que se tenha prazer em desenhar. Todas as culturas o atestam e em todas as culturas se verifica o gosto das crianças pelo desenho sob todas as suas formas. Seja num papel ou numa casca, na areia ou mesmo na água ou no ar, a criança sente satisfação em traçar linhas, contornos.» «Le plaisir au dessin» forma em francês uma expressão ambivalente: ou ela fala do prazer que se sente ao desenhar, ou então fala do prazer que se põe ele próprio a desenhar. Poder-se-á pensar que apenas o primeiro sentido é possível e que o segundo não passaria, no melhor dos casos, de uma metáfora ou mesmo de uma absurdidade. Contudo, foi a mistura das duas significações, como dois aspectos de uma mesma e única realidade, que determinou a escolha deste título.
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Este prazer nada tem de pueril. Se ele é infantil, no sentido próprio da infantia, quer dizer, se ele é anterior e exterior à linguagem, será porque põe em jogo algo mais do que a simples significação. Põe em jogo o movimento, o impulso que abre um tracejar. Neste sentido, o desenho — quer seja o de uma criança ou de um adulto — distingue-se justamente pelo facto de ser formado pelo prazer de abrir um espaço, de aí revelar e distinguir forças, zonas, tensões e intensidades.
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O desenho deve assim ser considerado como o acto ou como a expressão do próprio prazer que ele procura ou comunica: é o impulso de um ter-prazer-em-abrir-o-espaço [se-plaire-à-ouvrir-l’espace].
Neste «ter-prazer-em» — neste comprazimento, poderíamos dizê-lo, jogando com a palavra — há sem dúvida todo o espaço que se abre, e há todo o seu entrançamento íntimo com o tempo, esse tempo que o desenho suspende e põe a vibrar diante dos olhos.
[Jean-Luc Nancy]