Cálcio – Pádua Fernandes

13.00

Pádua Fernandes

“DISCURSO DA EROSÃO DO FIM DO MUNDO

se, antes de tudo, fosse o rato;
alimentara-se do céu
para que dos buracos abertos
caísse o vazio sobre a terra
e em toda a terra
não houvesse mais riqueza do que roê-la;

porque, antes de tudo, precisaríamos
do rato
a roer o caminho entre o continente e os homens;

a boca do rato: quando ele
encerrasse o seu trabalho,
todos os elementos por ela teriam passado
e o mundo poderia enfim começar;

a digestão do rato: depois
de todos os elementos terem atravessado
a digestão omnívora do rato, a merda
depositada nos esgotos
conheceria todos os elementos
e o mundo poderia enfim começar;

nos dentes do rato: a casa
de tudo viria a nascer:
erosão e saliva;

também a peste seria inútil sem o rato;
ele precederia as duas irmãs,
vida e devastação;

o rato antes do mundo
roera o que seria a luz e a sombra
e não se tornaria jamais luz e sombra
porém fendas
por onde escaparia o nada;

porém, antes de tudo,
não era o rato;
o mundo não pôde começar”

(pp. 58 e 59)

Esgotado

Descrição

Cálcio
Pádua Fernandes
Capa de Cláudio Mubarac
Averno, Outubro de 2012

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