Pier Paolo Pasolini
“Em vão sobre o papel onde escrevo
cai, nua, uma luz que extenuada
pelo percurso no ar do meio-dia
húmido e abafado – um milagre o Sol –
neste objecto extremo encontra
a sua perturbada agonia: em vão,
e em vão esbaforidas tremem as vozes
desde ruelas, desde janelas – num espaço
tão suave que as mata:
não acredito que é um novo dia,
este, em que volto a encontrar a minha alma
– talvez precisamente no ar e nas vozes –
virgem. É sempre igual a vergonha
que me reapresenta a sua imagem
virgem, vergonha de estar vivo
só por acaso, de não seguir o tempo.”
(p.40)