75 Poemas
Ruy Cinatti
Organização, Nota Introdutória e Posfácio de Manuel de Freitas
Averno
123 págs.
2014
SINGULARIDADE
Não sou mais puro só porque versejo
e Deus me quis contrariado.
O que me cerca, quase desejo,
afirma-se no tempo e na verdade.
O que me cerca tem um nome vão.
Uns dizem mundo, outros futuro.
Mundo futuro é binómio-cão.
Mordendo, ladra, os ossos me une.
O que me cerca suspende a razão
em ambos os pratos da balança.
Fica pairando, tremendo no ar
ave da esperança e da distância.
Sim! – ninguém ouse violentar-me.
Sou o que fui, serei – talvez milagre!
(p.100)
excerto do posfácio de Manuel de Freitas:
“Não creio que este despojamento lírico tenha qualquer tipo de paralelo (excepto, aqui e ali, na obra de Raul de Carvalho ou em certos poemas de Jorge de Sena) nas décadas em que Ruy Cinatti foi afirmando discretamente a sua voz. Assistimos, sem dúvida, a um tipo de economia poética que só encontrará herdeiros tardios – e nem sempre conscientes desse facto – no século XXI.” (p.114)